quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Avaliação Psicológica de Vigilantes: Custos versus Vidas

Em vigor desde novembro de 2013, a Instrução Normativa 70/13 do Departamento de Polícia Federal (IN 70/12) buscou normatizar o trabalho de avaliação psicológica para as empresas de segurança e para os centros de formação e reciclagem em segurança privada . Requisito previsto no art. 16, inciso V da lei 7102/83, que dispõe sobre as atividades de segurança privada no Brasil, a avaliação psicológica é condição indispensável para o ingresso e a continuidade da atividade de vigilante por conta do uso da arma de fogo, item este inerente à atividade de vigilante e sujeito ao controle do Departamento de Polícia Federal por força da lei 10826/03 (estatuto do desarmamento) em seu art. 6°, inciso VIII.

No parágrafo 2° do artigo 15 da portaria DPF 3233/12, que dispõe sobre as normas relacionadas às atividades de segurança privada, está estabelecido que “o exame psicológico será aplicado por profissionais previamente cadastrados no DPF, conforme normatização específica.” Tal normatização tomou forma na IN 70/12, que estabeleceu, dentre tantos itens, que o psicólogo deve ser credenciado pelo SINARM para a realização deste trabalho.

Um fator que gerou enorme polêmica no que foi estabelecido pela IN 70/12 foi a bateria de testes que deveria ser realizada para a obtenção do laudo de aptidão psicológica, bem como a obrigatoriedade da realização dos testes num local previamente credenciado pelo SINARM, que estabeleceu critérios quanto à iluminação, ruídos e adequações sanitárias. A quantidade de testes e a complexidade de algumas técnicas de avaliação propostas acabaram por tornar o trabalho de avaliação mais minucioso, demorado e (para preocupação dos empresários do ramo da segurança) custoso.

A via jurídica foi a solução encontrada pelo empresariado de segurança no Estado de São Paulo para revogar, ou mesmo protelar a determinação do Departamento de Polícia Federal para se realizar o trabalho de avaliação psicológica, muitas entidades patronais do segmento pleitearam na justiça federal um parecer que pudesse anular o estabelecido na instrução, com argumentos que versavam sobre a pouca quantidade de psicólogos credenciados e a falta de critérios para definir o perfil psicológico do vigilante.

A ABREVIS (Associação Brasileira das Empresas de Vigilância) obteve a concessão de uma liminar junto ao Tribunal Regional Federal da 3ª região, determinando a suspensão da IN 70/12 em 17/12/2013, que na prática estabeleceu que os efeitos que determinavam uma avaliação mais rigorosa seriam anulados por conta da necessidade da continuidade do trabalho das empresas de segurança.

Transcrevo parte do entendimento do Sr. MM Juiz Federal Dr. Victório Giuzio Neto, que assina a conclusão do referido mandado de segurança:

“Ademais devem ser sopesados dois valores: o primeiro das consequências do fechamento destas empresas e o segundo de que, mesmo sem o teste psicológico, e, portanto, da avaliação dos profissionais, uma segurança MESMO QUE DEFICIENTE vem sendo realizada.” (negrito meu)

Não se discute a validade da norma estabelecida pelo DPF (que pecou por não ter sido claro na IN quanto ao perfil psicológico desejado do vigilante), nem o entendimento do juiz federal que concedeu a liminar para a associação patronal. A questão da continuidade do trabalho de segurança privada num Estado como São Paulo é indiscutível.

Proponho somente uma reflexão sobre dois fatores que ficaram em jogo em decorrência deste conflito de interesses: A vida humana versus o interesse mercadológico.

Está bem claro o fato de que muitos (e felizmente nem todos) que contratam segurança, oferecem serviços de vigilância, formam ou reciclam vigilantes estão mais preocupados com os custos e com a diminuição de sua margem de lucro do que com a necessidade de critérios sérios de avaliação psicológica dos homens da segurança. Desconsideraram o entendimento do Conselho Federal de Psicologia e Do Departamento de Polícia Federal  acerca do tema, e ganharam na justiça o direito de continuar precarizando o trabalho de avaliação psicológica e oferecendo um serviço DEFICIENTE (palavras do Sr. MM. Juiz) de segurança privada.

Vejam aqui o preço da DEFICIÊNCIA:



Com o mercado saturado de psicólogos que se sujeitam a ganhar menos do que merecem, mas que precisam pagar suas contas e manter suas famílias, com a desunião da classe psicológica, com a falta de representações de classe com força para impor condições dignas de trabalho e com um Conselho Regional e Federal de Psicologia alheio à realidade profissional da classe, mais preocupado com o “social/antropológico/filosófico” e menos preocupado com a práxis do trabalho psicológico no dia a dia, os empresários da segurança se valem da chamada “livre concorrência” para buscar psicólogos mais e mais baratos. Mais e mais PROSTITUÍDOS.

Considerando que um psicólogo confere a um indivíduo o direito de portar uma arma de fogo por força de sua capacidade psicológica, permitir que um indivíduo pouco (ou mal) avaliado porte uma arma de fogo é muito arriscado.

Quantas mortes podem ter ocorrido por conta dessa negligência? Quantos suicídios de vigilantes? Quantas ações precipitadas? Sinistros...

Estatísticas não contemplam todos os fatos, mas qualquer vigilante vai afirmar empiricamente que já trabalhou com colegas “treze” (gíria utilizada por estes para definir pessoa com desequilíbrio psicológico).

Com base em tudo que foi explanado, só posso dizer uma coisa: “PARABÉNS” aos associados da ABREVIS pela obtenção de sua liminar. Conseguiram reduzir seus já elevados custos e protelaram por mais tempo algo que inexoravelmente irá ocorrer: o estabelecimento de uma norma que regulamente os procedimentos de avaliação psicológica de vigilantes.

Porém, tais consequências dessa liminar ainda serão sentidas por muita gente:

Você, cliente, continua perdendo porque paga caro por segurança armada e pode correr sério risco de ser vítima de seu próprio contratado, uma mão de obra DEFICIENTE conforme entendimento de um juiz federal.

Você, psicólogo, continua perdendo porque tem o seu trabalho cada vez mais desvalorizado e banalizado por colegas prostituídos pelo mercado que cobram valores ridiculamente baixos por uma avaliação de qualidade duvidosa.

Você empresário da segurança comprometido com o trabalho de vigilância com qualidade, continua perdendo porque cada dia que passa, vê o mercado saturado de desequilibrados com curso de vigilante e paga bem caro civil e criminalmente quando seu empregado comete um crime em decorrência de problemas psicológicos que poderiam ter sido evitados lá atrás, numa avaliação psicológica eficaz. Perde também pelo fato de que se vê forçado a proceder com a precariedade para não perder o mercado frente a concorrência desleal de empresários vigaristas que vêem no subemprego de psicólogos uma deixa para aumentar suas margens de lucros.

E você, vigilante, continua perdendo a pouca credibilidade profissional que possui, sendo agora caracterizado como uma mão de obra DEFICIENTE, porém necessária. Muitos de seus patrões e clientes (não todos) desejam que você continue assim, pois não querem tirar do bolso uma avaliação de qualidade que separe o joio do trigo nesta tão complexa, importante e pouco reconhecida atividade. Você continuará a ser nivelado por baixo por conta de desequilibrados que ostentam o mesmo uniforme que você.

5 comentários:

  1. Ótimo artigo, a questão é sempre o custo...
    As escolas (do ensino básico e médio) oferecem educação cada vez pior, as empresas de vigilância querem manter seus lucros sem pensar na evolução profissional de seus funcionários nem na melhoria do setor como um todo, e nem podem, tendo em vista a concorrência desleal e as limitações impostas; enquanto isso, os clientes querem contratar seguranças pelo menor valor possível.
    Ou seja, todos acham ruim mas ninguém quer assumir seu fardo.
    O que a PF deveria fazer é tornar o currículo da própria polícia obrigatório para os vigilantes, assim não haveria como alegar despreparo.

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  2. Eu sou vigilante e amo oque eu faço, e gostaria que as empresas e clientes valorizasse a nossa mão de obra, que é de grande serventia para a sociedade, nós zelamos por patrimônios que vale milhões, sem minimas condições para o trabalho, tem empresas que leva o seu funcionário ao posto e larga lá, sem passar as normas do cliente, e muito triste mas é a realidade, e a vida que não tem preço, quem se preocupa?. abraços aos da categoria. e Deus os guarde no seu dia a dia.

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  3. Olá Carlos, gostaria de saber se atualmente esta IN está em vigor ou ainda não é obrigatória para psicólogos, empresas e vigilantes?

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  4. Olá Carlos, gostaria de saber se atualmente esta IN está em vigor ou ainda não é obrigatória para psicólogos, empresas e vigilantes?

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  5. bom dia carlos eu queria saber porque os medicos credenciados nao podem atender direto das escolas formadoras de vigilantes alem de pagarmos o curso ainda teremos dispesas com transporte e etc..

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